segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Por trás dos números, um novo papel

Estudos do Sindicato Nacional mostram que a reforma em curso e os números do MEC ocultam indícios de que está em andamento projeto de reordenamento do papel da educação superior

No lançamento do PDE, o governo federal fez um balanço de suas ações no setor da educação e anunciou que, nos últimos 4 anos, criou quatro novas instituições, transformou seis faculdades federais em universidades, construiu ou ampliou 40 campi e repassou mais recursos financeiros para as instituições. Segundo os dados do Ministério da Educação, o orçamento global das universidades federais teve um aumento real de 22,7%, conforme o IPCA/IBGE: elevou de R$7 bilhões, em 1997, para R$ 8,6 bilhões, em 2006.

Divulgou também que abriu, e está em funcionamento desde 2006, o primeiro curso de graduação a distância da Universidade Aberta do Brasil para atender a cidades do interior do País. Os dados do MEC dão conta de que a primeira etapa do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sineaes) foi concluída, o que, segundo o governo, é uma iniciativa para garantir a qualidade do ensino.

Informou que os recursos de custeio e de investimento mais do que dobraram entre 2001 e 2006: de R$ 644milhões passaram para R$ 1,4 bilhão. Ao mesmo tempo, o ministério repassou valores para pagamentos de dívidas constituídas nos anos anteriores, como, por exemplo, para pagamento de água e luz, atrasados.

Os percentuais e os valores em reais, por sua vez, não convencem o movimento sindical docente, que garante que a verba anunciada não cobre as necessidades do sistema educacional. Uma das análises do GTPE do ANDES-SN mostra que, mais do que simplesmente a implantação de ações que visem à expansão e à inclusão social, a reforma universitária em curso e os números do MEC ocultam “fortes indícios de que um projeto de reordenamento do papel da educação superior esteja [também] em andamento”, afirma a diretoria do Sindicato Nacional em uma nota intitulada “REUNI, Universidade Nova e o ‘professor-equivalente’”, disponível no site da entidade.


Conceito transforma educação em mercadoria

O professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Roberto Leher, em artigo intitulado “A problemática da universidade 25 anos após a ‘crise da dívida’”, publicado na edição 39 da revista Universidade e Sociedade, do ANDES-SN, mostra como ocorreu e os motivos que levaram os governos latinoamericanos a criarem um novo conceito de educação superior com o objetivo de transformá-la em mercadoria.

Ele explica que na década de 1980, depois da Crise da Dívida, a América Latina foi reposicionada na economia mundial de tal forma que o modelo europeu de universidade, fundamentado na educação pública, gratuita e referenciada no princípio da indissociabilidade entre ensino e pesquisa, passou a ser um impedimento à transformação da educação superior em mais um serviço de mercado.

Leher diz que, em conseqüência disso, o Plano Diretor da Reforma do Estado, iniciado no governo FHC, trouxe para o Brasil a concepção de educação como serviço, o que foi aprofundado no governo Lula com as Parcerias Público-Privadas (PPPs).

Em decorrência dessa política de reposicionamento da América Latina e da introdução do novo conceito, o setor privado expandiu assustadoramente no continente.

“Em 1995, 46% das instituições eram privadas, em 1995, esse percentual alcançou 54%, e, em 2002, atingiu 65%, equivalendo a cerca de metade das matrículas. O caso brasileiro é mais grave: em 2004, 88% das instituições e 75% das matrículas eram privadas”, informa o professor.

No mesmo período, as universidades públicas tiveram suas verbas congeladas e, ao mesmo tempo, um grande crescimento de matrículas. A capacidade empreendedora do professor, expressa por sua habilidade para buscar recursos no mercado, passou a ser um dos principais critérios de avaliação da excelência acadêmica.

Assim, com a concepção de que educação é serviço de mercado e com o aprofundamento das contradições entre caráter público e privado, proliferaram-se, nas universidades brasileiras, as fundações privadas ditas de apoio.



Textos extraídos da Seção Sindical do ANDES do Boletim da ADUnB de maio/junho de 2007
http://www.adunb.org/boletim_jun07.pdf

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